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CINEMA – Resenha: Ainda Estou Aqui

Resenhado por Douglas Campagnol

Ficha Técnica:
Título: Ainda Estou Aqui
Duração: 1h 56min
Direção: Walter Salles
Roteiro: Marcelo Rubens Paiva
Elenco: Selton Mello, Fernanda Torres, Fernanda Montenegro
Gênero: Drama Histórico
Ano de Lançamento: 2024

RESENHA

Toda semana, recebo uma indicação de filme da Bia Cortez, e vou ao cinema sabendo apenas o título. Chego com a mente aberta, sem ler sinopses ou assistir a trailers. Hoje, ao assistir Ainda Estou Aqui, a experiência foi especialmente impactante. No início, não sabia exatamente o que esperar, mas fui completamente envolvido pela história — uma história que, mais tarde, percebi estar conectada a um autor que já havia marcado minha infância.

Marcelo Rubens Paiva, o autor de Ainda Estou Aqui (2015), que inspirou o filme, também escreveu Feliz Ano Velho, uma das minhas primeiras leituras marcantes. Me lembro de quando li aquele livro pela primeira vez, ainda criança, com suas páginas envelhecidas e o cheiro característico de um livro antigo. Era um dos livros favoritos da minha mãe, e minha avó, que trabalhava em uma escola, havia passado para ela. Esse livro, para mim, representou uma conexão com minha mãe e com o poder da literatura de tocar profundamente. A lembrança dessa experiência, carregada de memórias e emoções, me fez enxergar o filme de hoje de uma forma ainda mais especial.

No filme, Selton Mello interpreta Rubens Paiva, um engenheiro e ex-deputado sequestrado durante a ditadura militar, cuja ausência deixa uma lacuna irreparável em sua família. Fernanda Torres, em uma atuação de uma força avassaladora, interpreta Eunice, a esposa de Rubens, que enfrenta a dura realidade de criar os filhos sozinha e buscar respostas para o desaparecimento do marido. A maneira como Torres incorpora essa mulher forte, determinada e resiliente é de uma intensidade que ressoa profundamente. É uma atuação que nos leva a sentir cada dor, cada luta e cada esperança frustrada.

Assistir ao filme foi uma experiência quase solene. A sala de cinema estava repleta de pessoas mais velhas, muitos provavelmente com lembranças ou vivências que ressoam com a narrativa da ditadura. O silêncio ao final do filme era absoluto; ninguém se apressou para sair, e não havia conversas banais. O impacto era palpável, como se todos estivessem de luto, respeitando a dor da história de Rubens e de tantas outras famílias que passaram por situações semelhantes.

A direção de Walter Salles é cuidadosa e reverente, evitando o sensacionalismo. A narrativa se desenrola com uma sensibilidade que deixa o público absorver a crueza da história sem necessidade de exageros. As cenas que retratam os momentos de tranquilidade e amor da família Paiva antes do sequestro de Rubens são especialmente tocantes. É como se o filme nos preparasse, com esses momentos ternos, para a dor que viria.

A relação entre Eunice e seus filhos é central à trama, e a dor de não saber o destino do pai torna-se uma ferida emocional que molda a vida de todos. Em meio a isso, Fernanda Montenegro interpreta Eunice em sua fase mais velha, trazendo ainda mais profundidade e simbolismo à história. A presença de Montenegro como Eunice mais velha é um lembrete do peso do tempo e da força inabalável de uma mãe que carrega a dor e a incerteza por toda uma vida.

Ainda Estou Aqui nos deixa com questões difíceis e reflexões profundas sobre memória, perda e o legado de cada um. A resiliência de Eunice em buscar a verdade e continuar vivendo para seus filhos é uma mensagem poderosa sobre o impacto que deixamos nas pessoas que amamos. E enquanto o filme nos lembra das cicatrizes deixadas pela história, ele também celebra a força de quem consegue sobreviver a ela.

Nota: ★★★★★

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